quinta-feira, 4 de abril de 2013

Quando odiamos alguém, odiamos na sua imagem algo que está dentro de nós.



Esta frase de Hernmann Hesse faz-me pensar num episódio dos meus tempos de consultor numa editora. Embora se tratasse de uma casa que publicava livros de desenvolvimento pessoal, na redacção havia um ambiente de crispação devido aos confrontos constantes entre o designer e a coordenadora editorial.
Os dois eram jovens e eu não entendia de onde é que saía tanta hostilidade mútua. Comentei esta situação com um amigo que trabalhava numa fábrica e, talvez por ser tão alheio ao mundo em que eu lhe falava, deu-me uma explicação surpreendente: “Isso é porque eles gostam um do outro”.
Semanas depois soube que, efectivamente, os mesmos que atiravam pratos à cabeça um do outro tinham iniciado um romance.
Voltando ao sábio aforismo do lobo das estepes, muitas pessoas julgam equivocadamente que o ódio é o contrário do amor, quando a única coisa que se encontra no reverso do amor é a indiferença. O que não amamos – nem bem nem mal – não existe para nós. Se um país não nos atrai, simplesmente nunca pensamos nele.
Quando não gostamos de alguém, é porque essa pessoa possui algo que nos toca profundamente e nos provoca mal-estar. Esse alguém está a fazer de espelho de alguma coisa que está dentro de nós e que não queremos reconhecer. De outro modo não nos incomodaria tanto.
Assim, a pessoa avarenta sofre a avareza alheia com mais intensidade que qualquer outra, e o indiscreto irrita-se de forma desproporcionada quando sofre a indiscrição.
A pessoa que odiamos é o nosso próprio espelho e, portanto, um mestre espiritual que não devemos desprezar.
O ódio é a forma deformada do amor, mas amor, afinal. E se temos amor, também temos a capacidade de canaliza-lo de forma positiva, como a coordenadora editorial e o designer que trocaram as discussões por uma aventura sentimental.
Talvez discutissem porque o amor, ao ser detetado, causa medo, e o próprio medo é disfarçado pela aversão.
Portanto, da próxima vez que sentires ódio por alguém, procura o que está reflectido no espelho, qual é a lição que te veio oferecer. Depois examina aquilo que não gostas em ti e pergunta a ti mesmo porque é que ainda não o extirpaste.
Devemos ser mais sinceros connosco próprios.
Terminaremos com um “lobo das estepes” da indústria do cinema. Quando um jornalista perguntou a John Malkovich dos movimentos da extrema-direita, este respondeu: “não me preocupa o nazi que se cruza comigo na rua. Preocupa-me o nazi que vive dentro de mim.
In“A Cura Espiritual de Siddartha”, Allan Percy - capítulo 2

(Baseado no livro “Siddartha” de Hermann Hesse)

 

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